quarta-feira, 12 de maio de 2010

Sem´ediador


O que você está lendo? Qual sua banda preferida? Você viu como aquele menino lá da sala se veste estranho? Ficou sabendo daquele escândalo? Vamos dar uma volta no shopping? Viu o último jogo do campeonato? Eu prefiro esse filme! Nossa, onde você comprou essa roupa? Viu o último episódio na televisão? Aquele ator de cinema é tão bonito! Vamos pro show lá na Arena Foliã?... Olha só o que meu celular novo pode fazer! Você ainda não viu o meu carro zero!

O que há entre eu e você? O que nos liga? Objetos? Pessoas alheias? Instituições e espetáculos exteriores? Como nos relacionaríamos sem todas essas "coisas"? O que sabemos sobre os interiores? O que expomos sobre nossos seres? Quando conseguimos nos ligar diretamente às pessoas, sem mediadores, coisas que sejam 'pontes' artificiais? Quando as relações são verdadeiras? O que é verdadeiro em nossas vidas? O que somos além de consumidores? O que resta em nós? (Como se sobrasse muito pouco depois do consumo...) Por que o dinheiro é o mediador da humanidade? Por que é uma coisa? Por que a principal e mais frequente relação firmada entre as pessoas é a de compra e venda? Estamos a venda? Quem nos comprou? Quando nos vendemos ou nos venderam? Quem estipulou esse preço? Temos um preço? Meus sentimentos são uma fonte de lucro? Minhas inseguranças, uma forma de aquecer o mercado? Minha incerteza a fórmula certa para conseguir novos consumidores? Minha ignorância a melhor ferramenta da riqueza? Eu quero ser rico? O que é riqueza? O que eu quero? Minha realização baseia-se em conquistar salários ou rendas? Qual o conforto que prefiro? O artificial gás gelado do ar-condicionado ou a brisa fresca do mar? O que eu conheço sobre as pessoas? O que elas conhecem sobre si mesmas? Gostos de consumo? A marca preferida e o melhor restaurante? Quais os meus valores? A liberdade para quem pode pagar? A fraternidade dos meus interesses? A igualdade padronizada pela indústria? O individualismo depressivo de estar sozinho? A paz privada das cercas elétricas? A tranquilidade dos remédios tranquilizantes? A saúde alopática da "loja de drogas" (drugstore)? O sucesso do carro fervendo no calor do asfalto, queimando a atmosfera e odiosamente preso no engarrafamente de milhões de carros? A estabilidade rotineira de ser sempre o mesmo? A frustração por sonhos esquecidos? O vazio da aminésia interior? A miséria generalizada da minha vontade de comprar o que quer que seja? A minha satisfação individual por me considerarem igual a eles, melhor até? A minha vaidade ditada pela moda? O meu egocentrismo de só ouvir a mim mesmo? E nem mesmo saber o que eu digo...?

O que resta de nós sem todos os mediadores? Todas as formas artificiais de fazer parte da sociedade? Quando descobriremos nossos sentimentos? O que nossa emoção nos conta sobre nós mesmos? Quem nós somos se tirarmos nossas máscaras familiares, acadêmicas, profissionais? Quem cria meu eu se não for eu?

Um comentário:

Samis disse...

maravilhoso o texto

A paz privada das cercas elétricas? A tranquilidade dos remédios tranquilizantes?

quero ele impresso