segunda-feira, 30 de abril de 2012

Deixa ser como será...



És qualquer mágica
brincadeira de mãos
Ar que sobe
Turbilhão de emoção
Terra no corpo
Nascer e sorrir
A insônia linda
O não-querer dormir

És mais que pele
Raízes e frutos
És o morder da polpa
E o escorrer da boca

O suor de açúcar
O prazer de verão
A alegria da abelha
Tequila com limão
O vibrar doidamente
Arritmia, explosão

És viciante, delícia
A pura sensação
A perda de consciência
N'outra dimensão
O universo
em toda direção
a beleza de tudo
o coração...


Ganache


Um encontro de rios e mar...
Uma semente flutuando no oceano...
De infinitos lados, afetos sem fim...
O soltar, soltar, soltar...
Nas mãos dadas, doidas, sin dudas...
Ah, menos palavras, mais caramelos
O belo e o sublime daquele russo demorado
Indescritivelmente longos raios de luz
Refletidos no fundo dos olhos de lua negra cheia
Tudo que é, foi, será... o espaço-tempo desmanchado
Em ganache de micro-súplicas
Ânsias, unhas, prazeres desmedidos
O devagarinho conhecer do ínfimo
Linhas, tons de azul, matizes sutis
dando voltas e mais voltas no meu nariz
...
Saio do chão, não há chão...
É mais do que a gravidade pode suportar
A explicação embaralhou-se por entre as palavras
A mente eclipsou, deslumbrou o mundo
E o melhor, é que não assisto
Insisto, misto, mergulho
mergulho tão fundo no teu segundo
no teu centímetro, no teu mundo
como morrer, 
"morrer é como mergulhar n'um lago profundo n'um dia quente... Há o choque da mudança brusca e fria, a dor, por um segundo; e depois a aceitação é o nadar na realidade"... 

Pergunta-me se morreria... Respondo que não há mais diferença
Não posso morrer, nem que quisesse, pois a vida fundiu-se
em tudo que há... vivo e morto são palavras vazias... As palavras morreram,
Só restou o (a)mar...

Interlúdio

As palavras estão muito ditas
e o mundo muito pensado.
Fico ao teu lado.

Não me digas que há futuro
nem passado.
Deixa o presente - claro muro
sem coisas escritas.

Deixa o presente. Não fales,
Não me expliques o presente,
pois é tudo demasiado.

Em águas de eternamente,
o cometa dos meus males
afunda, desarvorado.

Fico ao teu lado.

Cecília Meireles

_____________________________________

Desta vez o frio na pele não doeu
porque o espírito ardia de afeto

Desta vez a dança foi de dois,
entrelaçados em uma sincronia leve e alegre,
ao invés daquele torpor que me acomete
de isolameneto, aquela introspecção fugidia
de olhos fechados que se bastam

As dúvidas angustiosas se curaram ali mesmo,
pelo cuidado da entrega...
Resolveu e conseguiu não se ator-doer
mas antes, abandonar-se na brincadeira dela...

A surpreendente cena
por um momeneto tornou-o platéia quase ausente,
mas em seguida, convidado, aceitou...
aceitou tão fortemente que cerrou os dentes
os dedos e a pulsação...

O toque chegou cada vez mais na pele,
os dedos sentiram mais, o calor subiu
estava lá, de fato... nem menos, mais...

A dança, a música, como uma substância
pulou do lugar dos julgamentos e pensamentos vãos...
levando-o/nos onde o que importa é sentir

Após suar todas as fraquezas
tóxicas, foram rumo ao amanhecer do aqui

N'uma madrugada se desconbriram mais do que 
jamais esperavam... 
Dizer coisas difíceis é libertador...
Guardar em si certas trevas não é nada bom
O partilhar ilumina a noite e as nuvens de baunilha
adocicam as horas úmidas do espírito

Um dia imendado n'outro
incontáveis momentos - êxtase... 

Noções


Entre mim e mim, há vastidões bastantes
para a navegação dos meus desejos afligidos.

Descem pela água minhas naves revestidas de espelhos.
Cada lâmina arrisca um olhar, e investiga o elemento que
a atinge.

Mas, nesta aventura do sonho exposto à correnteza,
só recolho o gosto infinito das respostas que não se
encontram.

Virei-me sobre a minha própria existência, e contemplei-a
Minha virtude era esta errância por mares contraditórios,
e este abandono para além da felicidade e da beleza.

Ó meu Deus, isto é a minha alma:
qualquer coisa que flutua sobre este corpo efêmero e
precário,
como o vento largo do oceano sobre a areia passiva e
inúmera...

Cecília Meireles 

Uma música - Mistério do Planeta - Novos Baianos

sexta-feira, 27 de abril de 2012

?

 "A tua consciência
 é a medida da sinceridade
 do teu egoísmo"

Richard Bach
no livro Ilusões - As Aventuras de um Messias Indeciso

Calcinhas no chuveiro...


Texto de João Aureliano e Ana Agra 
(gentilmente cedido, ou melhor, descartado)

Acordou-se e tentou lembrar do que havia acontecido na noite anterior, mas tudo ainda estava muito embaçado em sua cabeça. Aos poucos, os pedaços que conseguiu montar foram deixando-na mais e mais possessa. Andreza, era o seu nome, estava certa da traição de Antônio, e nada poderia prová-la do contrário. Estava lá! Ela viu! Viu o jeito que eles se olhavam e como nada daquilo parecia certo. Sentia-se como peão de xadrez, apenas ocupando espaço no jogo dos dois. Como pode? Como teve coragem? Carla não chegava aos seus pés! Todos os pensamentos foram vindo em turbilhão no imaginário de Andreza enquanto ela pensava que poderia MATAR Antônio e destroçar cada um dos seus ossos até chegar em seu coração de pedra. Debateu-se. 

Suspirou. Repensou. O que podia ter acontecido com eles dois? Seria culpa sua, Antônio ter voltado os olhos para outra mulher? Começou a refletir um pouco em como teria agido nos últimos dias. Andara mais fria. O trabalho tomava de conta de tudo em sua vida e pouco tempo sobrava para o noivo. Nossa... Mas que nova ruim ela podia estar sendo... Nem lembrara do aniversário de 5 anos de namoro que havia sido na semana passada. É, Andreza... nada bom...

Mas não é desculpa nenhuma! Se estava fria, ele já havia estado muito mais! E quantos aniversários de namoro ele já havia lembrado? Oras! Nenhum! Aquele escroto estava com ela só pela comodidade, sexo fácil! Fugia do assunto de casamento! FUGIA!

Acendeu um cigarro enquanto experimentava o gelado chão das 6 horas da manhã. 

1, 2, 3 tragos. Passou a mão pelos cabelos. Melhor assim, pensou, melhor assim. Não era como se Antônio tivesse sempre se importado com ela. É triste porque qualquer tipo de traição vem a ser triste, mas não é como se fosse o fim do mundo. Mais um trago. Levantou. Abriu a janela e o sol cegou seus olhos. Pensou em todas as possibilidades, em todas as coisas que já não fazia por causa dele e que agora podia faer. Pensou em Shopping, em poder atrasar a depilação e pendurar calcinha na válvula do chuveiro. Pensou felicidade, pensou alegria e pensou paz. "Sim, é possível ser feliz sozinha". Colocou saltos, vestiu a roupa de sair e sorriu.

FIM
_______________________________________________

Estranho. Não consigo. Não consigo me preocupar com isso, ser traído, ciúme, controle, o que o outro estará fazendo, pensando, sentindo agora... (?)... É como se eu não estivesse nem aí... penso que, ou sou a pessoa mais cega e ingênua da terra nesse sentido, totalmente desligado disso, ou simplesmente é algo impossível para mim... quem pode me trair senão eu mesmo? Quem está comigo, está... se não estiver, não está! Resolvido! O que mais se pode fazer? Onde está a brecha? A rachadura? E o que é alguém se trair? Se trair é não saber-se capaz de si, incapaz, fraco, que não pode ser, não consegue, que tenta, mas não é... não poder confiar em si, saber-se não confiável, falho diante de si mesmo, falho para si, falho para ser... é insuportável... É?... Enfim... Se "tudo acontece da melhor maneira possível" e se está com alguém que não está contribuindo para ti, qualquer fato que revele tal realidade é simplesmente uma dádiva... Libertar-se de algo que não te cresce... é impossível trair alguém, senão a si... nos traimos... É? Quando nos achamos em uma situação, acreditamos em algo, que de fato não é (o que é "não ser"?), é pura aparência, ilusão ou idealização... quem idealizou? Quem criou a aparência? Quem fingiu? Se estávamos entregues, se aproveitamos, vivemos, fomos felizes... alguém pode dizer que não era real? Que não aconteceu? Como saber se é "real"? O que é "real"? O que é "verdadeiro"? Por que duvidar se é "real" ou não? Se foi bom, se valeu a pena, o que importa?! Como desaproveitar retroativamente? Ah, eu fui muito feliz naquele tempo, mas como não era real, não fui feliz realmente, apenas uma ilusão, um engano... (?) Mas o que se viveu não foi vivido? Dá para desviver? Ou então há, de fato, uma cegueira, ou uma opressão mútua... se alguém não quer, mas não tem coragem de dizer, e a outra pessoa quer e não percebe o outro, o que significa? O que é vivido por cada um?... Eu, realmente, não me preocupo... ou, se me preocupo, me divirto... pois jamais poderei saber... se o outro está ou não está... se para mim está, está, se sinto que não está, não está e vou procurar outra coisa para fazer, ser ou estar... Ou melhor, pergunto: você está? Cadê você? Onde estás? Queres estar aqui? Queres ir para outro canto? Vá... ou fique, faça como quiser... apenas faça como quiser... se não quiser, não faça... é tão simples... por que parece tão difícil?! Qual a dificuldade de fazer simplesmente o que quisermos?! Sermos sinceros conosco?! O difícil não é ser sincero com o outro, o difícil é ser sincero consigo... a sinceridade com o outro é praticamente um mito, impossível, pois os canais de comunicação são todos imperfeitos... a sinceridade com o outro, só sendo-o, fundindo-se dois de alguma forma muito quente, como uma explosão solar... um apocalipse... ser sincero com o outro é morrer junto e nascer de novo... O que é ser sincero consigo?! O que é preciso para tal? Como fazê-lo? Tal sinceridade exige um conhecer-se tanto, mais tanto, tão profundamente, que nem sei... Mergulhar-se em si, derramar-se, esvaziar-se, evaporar-se, encircular-se... E, tão sincero consigo, tão si mesmo, como ser afetado por qualquer coisa ruim?! Como sentir-se mau senão por pura escolha, pelo simples prazer da sensação, porque não há mau nem bem, há apenas sensações de toda sorte, sabor, textura e matiz... Livre, sendo nada, nem de ninguém, logo, tudo e em todos...

Uma música - Adeus Você - Los Hermanos

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Enfeitar...


Segundo a segundo, é assim que o tempo passa com você. Vive-se tudo, tudo que há para viver em cada partícula, cada pedacinho de tempo, todo o olhar possível, todo o dizer e ouvir sua voz e a minha, todo o tocar e o chegar, tudo. 17 dias. 17 histórias/aventuras. 17 mil possibilidades reais, proibidas e permitidas, desobedecidas, mordidas, queridas. O difícil é dormir, o difícil é despedir, é trocar o corpo pela memória, a sensação presente, pela chama que fica na pele, a voz pela recordação, as imagens fotografadas nas correntes elétricas extáticas da mente...

Viver é conhecer... mentira, é sentir... conheço cada vez mais tuas/minhas sensações que te/me deleitam... sinto o conhecimento de ti se apoderando de mim... derramo-me em suor ameno nas tuas minúcias... desbravo os teus detalhes por debaixo de cílios do campo, perfumando meus sentidos com sincera entrega... Nos damos... nos doamos... sem compra nem venda, sem posse ou pertença... sem a ilusão da permanência, brincamos a todo momento de enganar o tempo... esticá-lo, torná-lo alto, enorme, correndo dele, se escondendo atrás da árvore, deixando-o nos procurar... Esquecendo que por mais que seja longo nosso tempo, sem nem perceber, já é madrugada... e a madrugada pede passagem e pede sono...

Mas vamos... ousamos não aceitar. E pernoitamos em sonhos que não lembramos, mas estávamos lá. E vamos! Vamos ir pra longe, onde o sinal não chega nem as portas batem... 

domingo, 22 de abril de 2012

Acelerada... ligeira... intensa... 
Vida, ela, nós...

O que é intensidade? 
Quantidade? Potência? Excesso? Transbordamento? Imensidão?
Como pode a vida ser uma montanha russa, que a cada curva, dá uma cambalhota, cai repentinamente e antes que a cabeça páre de girar, sobe novamente, passando por dentro de uma cachoeira, no alto de um penhasco de ideias e sonhos, atravessando as lembranças do ontem e do amanhã em uma velocidade que estica e conecta a percepção e o entendimento... louco... meus sentimentos vibram de forma incontrolável... meus nervos pipocam, estalam, saem faíscas... meus músculos gemem de desejo, o sangue parece um parque aguático de tão rápido que se bombeia, percorre as veias-tobogã, oxigena meu corpo, alterando-me a consciência...

E ao final do passeio/momento, só o que se sente é "de novo! de novo! de novo!" (risos!), como uma criança que se apaixona pelo brincar, pelo sentir, pelo estar, pela outra criança, pela infância, pela liberdade de fazer o que quiser sem julgamentos, moralismos, apenas amor, carinho e cuidado...

sexta-feira, 20 de abril de 2012

descobertas...

Desnuda, desmuda, despida...
Céu, azul, marinho...
Deitar-me na tua praia linda...
Encharcar-me no teu carinho...

(Imagem: Orlando Pedroso)

Aperto

Ai, menina... me sento na calçada e te quero.

Uma música -
A primeira vista - Dota e Chico César


(Imagem: Orlando Pedroso)

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Não sou o que contam de mim...


Não é tão fácil partir. Não é tão insensível deixar. Não é tão indolor quanto parece. Não há nada que não doa. A fome dói, a cama dói, o ar dói. Apagar da superfície, como aquelas pegadas na areia que somem, rápidas, fugazes... é simples. Mas guardar tudo, aquilo tudo, tudo aquilo, tanto e muito, nos devidos lugares, organizados, compreendidos, desprendidos, é um trabalho um pouco mais demorado.

Nos caminhos do mundo, passando na janela, na noite lá fora, de estrelas torcidas, das luzes pequenas, amarelas e velhas, das cidades perdidas, ruidas e desertas... Percorro-me inteiro, indo e vindo, vou e volto, abro e fecho... respiro... refresco... deixo arejar... Há muita sensação para desacostumar...

Vivo... e esta chama viva azula, avermelha, chamusca, bruxuleia...

Lembrei-me aquela noite, em que percebi uma muralha que se erguia: perdê-la seria para mim, naquele momento, o nunca mais entregar, nunca mais me dar, nunca mais dizer-me, nunca mais deixa-me, nunca mais cair-me... senti essas pedras no meu peito... Senti essa corrente me arrastando... senti esse abismo me abraçando... e transbordei... derramei... me derramei... me afastei... No balanço chorei essa perda... sofri o futuro... deslizei a parede abaixo... e fui embora.

Não quis. Não quero. Essas paredes, esses tijolos, esse concreto. Fui embora. Daquele dia em diante compreendi melhor... "o fim é inevitável"... E não o procurei. Vivi cada momento, dei-me a cada momento... cuidei de cada momento... estive em cada momento... Mas, aprendi a deixar ir...

Naquela manhã insone... de filme que percorreu eras... de desconsolo, de perda...

No dia seguinte... na minha praia... no meu lugar... onde sou mais que em qualquer outro... Nos separamos. Ela correu. Eu corri. Ela parou. Eu não. Ela não veio. Deitou. Eu fui. Entrei na água. Fria. Delícia. Plena. Imensa. Ao voltar, querendo abraçar... procuro. Não acho. Procuro. Não acho. Procuro. Não acho. Procuro. Não acho! Sumiu! Sumiu! Sem nada, pra onde?! Será que o pior aconteceu?! Desespero! Não vejo, meus olhos estão salinos, pergundo, procuro, enlouqueço... quando atravesso a rua em busca de ajuda, a vejo. Lá. Querendo matar-me parando o coração. Foste embora. Foste embora. Novamente. Ódio. Dor. Raiva. Como deixas-me assim, louco, sem saber, pensando ter acontecido o pior, eu que sempre penso o pior... Escondeu-se na esquina, mentiu dizendo ver-me, mentira. Sumiu. Fugiu. Morri, morreu. E naquele instante, nunca mais irias voltar ali. Nunca mais iria te levar... marcou-me a ferro a dor e o desespero...

Muitas quebras, muitas pedras, muitas eras...

Vivo... vivo mais. Liberto. Desperto. Aberto.

Uma música - Guaranteed - Eddi Vadder - Into the Wild

Réplica

Cariño,

Nada sei [,] contigo... e, contudo, sabemos tudo... debaixo da pele da alma existem todas as respostas... debaixo das unhas dos desejos temos todas as dúvidas... A verdade e a dúvida são uma mesma correnteza, fluindo, indo... límpida porque em movimento...

Então, o quê? Por quê? Se tudo, se nada, se mais e menos, se quente e frio, se mundo e vazio, se medo e destemor... verdade e mentira... Tudo que é, ao mesmo tempo não é...

Fico tonto... fico mudo... me perco. Comigo, contigo, penso, esqueço, desejo, desespero...

Seria eu inconstante? Já escrevi isso certa vez, há anos, muitos, n'uma época em que eu era ainda uma rocha, um quebra-mar... ondas e mais ondas, até virar-me praia... ou o contrário...

"Toda vez que penso me conhecer, percebo que não sei nada sobre mim"... Foi algo que pensei há algum pouco tempo atrás...

É isso... há um grande problema no saber... quando pensamos que sabemos, é esta a maior prova do inverso...

Não pense que sei de algo...
Faço perguntas justo por não saber...
Talvez...
..............Acho que só é possível
...................compartilhar... e fazermos nossas respostas, rascunhá-las, rasgá-las, trocá-las de tempos em tempos.

Se tenho uma inconstância, é nas certezas...

Não fuja... (?)
O que é fugir? (risos)
Sugiro fazer o que lhe convir, o que lhe der mais prazer ou o que for mais difícil...
Não, não sugiro nada.
Calo.

Apenas sinto...
..............(des)sinto
..............(Ab)sinto
..............(mentira)


O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

F.P.

Uma música - do amor - Tulipa Ruiz

Aprendi

Ninguém é insubstituível
Não se pode depender de ninguém
Mas ninguém é igual
Logo, não se pode querer repetir...

É preciso ir, continuar

Voar. Se parar, pesa...

Aprender com a inevitável possibilidade do sim ou do não.

Não tomar nada como
......................................certo
Não acreditar em nada,
Apenas no todo...
em nenhuma parte...

Ilusão...
...........Alguém pode nos fazer mal?
...........Alguém, além de nós, pode nos fazer sofrer?

É o sofrimento algo de fora? Que nos aflinge?
É o sofrimento real?

O que é a paz, senão qualquer caminho
de seda ou de espinho
.............em que simplesmente
.............se está... simples.

Por que complicar?

Qual a diferença entre o criativo e o complicado?

E aquele entrelaçado, manta, rede, trama...
Inesplicavelmente complexo e belo...?

E aquela folha e suas mil veias? E aquela teia que a aranha tece todo dia e ao final, desfaz?

Por quê?

Diversão?

.........................Só importa a diversão?

Aprender a
brincar
a rir
a sorrir
se entregar
a cair, chorar e achar graça?

Rir de si, sempre
Do ridículo de si, do falso, do fraco, do pouco de si?
E dessa forma ser nada e ser tudo?

Destruir-se e quebrar na maré?

Ser apenas luz? Onda?
Partícula de carinho
de cuidado, de amor?

Não pensar no que se é...
Apenas sentir tudo, a dor, o aperto, o fruto
Molhar a boca com o gozo dela?
Derreter no chão em pura ausência?

Esquecer o eu e o tu... superar...

Desaparecer as nuvens e flutuar? Atravessar paredes?

A matéria some diante de mim, e como sou o nada,
nem sumir pode, apenas fluir...


Uma música - Ensaio sobre Ela - Cícero

sábado, 14 de abril de 2012

Ser e estar com o mundo...

Em todo lugar há...
a possibilidade de viver... a imprevisibilidade do você... a indescritibilidade do estar... a imperiosidade do ser... a ingenuiade genuina do não-pensar... a leveza que vai longe do soltar... a despretenciosidade do não-se-preocupar... a inculpabilidade do morrer... a descredibilidade do crer... a infalibilidade do deixar... a indestrutibilidade do querer... a infantilidade do não querer... a juvenilidade do tocar... a melhoridade do sofrer... o melhor momento para se entregar... a versatilidade do não-resistir... a fluibilidade do desabrochar... a umidade do nascer... a sofregidão do chorar... a flutuabilidade do saborear... a imprescindibilidade do libertar...


Uma música - Preta - Cordel do Foto Encantado

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Cariño de no dormir...

Só preciso do que quero...
Só quero o que preciso...

Entender o que sentimos... por que nos sentimos assim? Por que essa angústia ou ânsia ou desejo que foje ao agrado? Essa vontade maior que a possibilidade, que de tanta chega a escapar? Por momentos o desconhecido de nós mesmos obscurece os sentidos e os pensamentos... Sentia-me apertado por mim mesmo, como se o tempo insuficiente faltasse o ar... Como se algo me faltasse, como se eu não bastasse... Um furor erosivo, como o vai e vem das ondas ante as rochas...

Agora a tempestade passa... Ficam os ventos fortes, que enchem os tecidos e levam adiante... O caminho permanece firme rumo aos braços do desconhecido e adorado... Entendo-me cada vez mais. Percebo-me. Olho para mim e observo... E ao mesmo tempo vivo... tento não evitar nada, sentir tudo, ver o que acontece... chegar a um ponto de beleza e êxtase... Sinto falta da explosão... quero uma explosão... de tudo que tenho em mim, tudo que quero, tudo que anseio... quero deitar-me exausto novamente... Sinto falta dessa exaustão, do ar quente e gostoso após o fogo, aquela neblina que sobe dos corpos comburidos... Tenho medo... um medo que delicia... o não-saber, o estar nas mãos do agora, que pode me deixar cair a qualquer momento... a possibilidade da dor causa um certo prazer... ou melhor, torna mais sôfrego o prazer alcançado... A presença torna-se não obrigatória... ter a opção e ao mesmo tempo não ter a opção é às vezes azedo, algo que arrepia o pensamento, que deixa-me em dúvida sobre o sentir... entrego-me ou contenho-me? Deixo-me ou levo-me? O desapego me intriga. Não sei o que pensar... sinto que meu pretenso ideal ainda é para mim uma icógnita... não compreendo... finjo, tento, mas sou o primeiro a trair-me nesse ideal... O que sentem aqueles olhos grandes e fugidios? O que sente aquele corpo? Aquela pele? Aquele sangue?... É claro que é impossível saber, mas essa incerteza me causa certa estranheza... como um cego andando a esmo... cujas mãos buscam aquelas de seu sonho e podem simplesmente não encontrar. E quando encontra, logo se vão, não duram, tão rápidas... passa tão rápido nosso tempo... queria-o tão mais demorado... queria sem ter que pensar no fim, na hora de deixar, de ir, de separar... E a cada instante aprendo algo em algum canto escondido de mim/de ti... Alguma ruela cuja lâmpada ainda está por se iluminar...

Aventura. Ah, ventura... venha e me seja...

Uma música - Aire - Mochachito Bombo Infierno

domingo, 8 de abril de 2012

Saiba que...


Advertência...

Eu não sou a prova de dor. Eu não sou anestésico. Eu não "só" faço sentir bem... Eu faço sentir muito bem, causo muito prazer, alegria, sorrisos, êxtases, ápices, desatinos... Mas também doou... angustio... desagrado... aflinjo... agonio... agonizo... desespero... inquieto... enlouqueço... esfrio... Aqueço, aperto, amo, me apaixono, penetro, desperto, explodo, intenso, extenso, alento, aconchego... e solto, caio, morro, saio, corro, raio, mordo, raivo...

Uma música - Aqui - Cordel do Fogo Encantado

Poesia Pagã

Estou aprendendo a morrer e a nascer todo dia...

O que isso significa?!

É não partir de nada. É não partir de um passado. É não viver no passado. Mas unicamente no agora. Nasci. O que posso fazer? O que posso fazer hoje?! Comigo, com quem estiver comigo, seja ao redor, seja no coração...

Uma música - Pagan Poetry - Bjork

Imerso...


Os dedos foram escorregando, suados, os galhos, raízes, margens... as unhas deixaram de agarrar-se na areia, preta, argilosa, úmida... os braços exaustos cederam, desmancharam-se... As forças cessaram de resistir... E então... se soltou... caiu... flutuou... na correnteza gelada e firme, forte, veloz... Soltou-se... foi... desceu rumo ao mar... porque toda correnteza leva ao mar... toda veia leva ao coração... toda parte leva ao todo... E parou de se preocupar com o caminho... Simplesmente navegou... quase à deriva, mas com a clareza do caminho, a beleza do ondular, do caminhar, do seguir... Abraçado com a água se apaixonou pelo líquido, pelo fluxo, pelo vívido... apaixonou-se por tudo, por cada, em cada... respirou o ar molhado, sentiu a vida o levar... e foi...

Uma música - The Rip Tide - Beirut

Voilà


Conclusão! Compreendo agora! Não se trata de reprimir nada... lá estava eu me reprimindo de novo. O problema não é o nosso querer, é o nosso reprimir... Se quero sentir falta, ótimo! Qual o problema? Se quero tocar, sentir, lembrar? Ótimo! Por que me repreender? Se quero desejar, por que não!? Se quero sonhar, faz parte do momento esse contemplar, esse recordar pr'a frente, rever o ainda por viver... Evitar o sofrimento? Pr'a quê? De que adianta? O problema não é me apegar... é não compreender que é passageiro, é segurar... que é movimento, que é mudança, que é fluxo... Apego-me agora, desapego-me depois... livremente... para viver tudo.

Uma música - Vagalumes Cegos - Cícero

Nova Política


Tentando me acostumar... À ideia de não me apegar... À ideia de simplesmente estar... Eu a compreendo, acredito nela completamente, mas vivê-la requer uma segunda compreensão, dos batimentos cardíacos acelerados, do sabor na boca, das mãos arfantes, dos olhos cerrados, do espírito... porque fica aquela vontade, aquele hábito, aquele impulso de querer agarrar, de querer saber, saber minha, dela, minha...

Dá aquela ânsia, aquele desejo, aquela falta... O que significa a saudade e a lembrança quando não nos amarramos...? O que significa o pensamento quando somos asas e ventos? O que significam os sentidos quando somos mar?...

Aquela dúvida. Ter controle de si, não ir, saber estar, saber ser... apenas ser... apenas ser... Jamais esperar, brincar, divertir, sorrir, abraçar... Soltar. Soltar. Apertar. Soltar. Apertar. Soltar. Apertar. Soltar...

E o que é o amor?! Como fica o amor?! Há amor?! Ainda existe amor?! Ou o amor também se libertou?! Não mais algo individual, mas difuso em tudo, em todos os olhares, todas as folhas, todas as ondas, nos pés, nas mãos, na grama, no céu e no sol? Como é fazer parte de tudo!? Como é deixar-se levar pela correnteza?! Como é abandonar-se nos braços da vida?! Como é abandonar-se?!?! Como é?! Como é?!

Como é não ter medo?! Como é fechar os olhos, não saber, mas não temer?... Não saber, mas não temer? Sem certezas, sem garantias, sem amanhãs... só agoras, aquis, hojes, esse exato momento! Não sei se vai voltar amanhã, se irá me olhar, me beijar, se será ou não será... Não sei se vou querer, se irei chegar, não sei se ainda vai gostar, não sei se terá mudado de ideia, não sei se nada ou se tudo... Sem controle... Nunca temos controle... Como é viver isso verdadeiramente?! Sem a ilusão do controle, da certeza, do amanhã?! Sem ilusões?! Desiludido?! Como é viver?! Viver plenamente?! Viver o agora! Estar aqui, ser aqui! Não deixar para depois, não pensar no depois, não saber do depois...

Imagino. A vejo, a quero. Te quiero...

Uma música - Açúcar ou adoçante - Cícero

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Morena

O que você acha de mim? E quem sou eu? Se definir, mata! Se achar que sabe, perdeu... Se segurar, sofreu... Se amar, é seu... mas não sou eu.

O que eu quero? Maré... O que eu faço? Quebrar... O que eu amo? Molhar... O que eu desejo? Brincar...

Quando? Na pele... Onde? Assovio... Por quê? Arrepio... Como? Desvario...

Então, vai chegar? Na roda, entrar... vamos jogar, mandinga e gingar...

Uma música - Morena - Marcelo Camelo

É...


A felicidade não está, ela é.
Não depende, ela quer...
Não vai, não vem...
Pra você e pra ninguém

Não espere... não olhe para trás...
Que a memória esteja à frente,
Como mistura no caminho do agora
Chore, sorria, despenque
O que o corpo estiver afim
E a alma estiver sem fim...

Olhe, sinta, cheire...
O sabor não está em mim, está em tudo
O sabor é muito mais que um corpo
É muito mais que uma parte
É nada mais que a arte
De saborear...

Ande, ande, ande!
Se parar, cai!
Se cair, dói!
Se doer, foi
O maior aprender
Antes ou depois...

Nasce, morre, acaba, começa...
Quem quer parar a roda, se atropela
Apagar o fogo, se queima
Descansar a vida, morre
Descascar ferida, geme
Desandar na vida, corre
Desfrutar comida, morde
Saciar a partida, chega
Se integrar ao fluxo, solta...

Uma música - Alone in Kyoto - Air

Cheio...

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.

O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.

O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.

O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.

Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.

O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.

O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.

O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.

O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.

O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.

O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.

João Cabral de Melo Neto

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Liromar


Morri.


Nasci.

No mar me criei, no mar floresci, no mar andei, no mar senti.
Não estou separado,
não é meu pé e a onda...
Não são coisas diferentes a areia e meus dedos...
Não existe fronteira entre água, sal e sangue...
Tudo é...

Quem sou eu? Como me chamo? Mar...
Onde estou? De onde vim? Mar...
Para onde vou? O que é? Mar...
O que existe, o que não? Mar...

O Eu morri. Não há mais Eu. Existo. Existe. O todo, o tudo.
Sou, apenas... mais nada... E se nada, de ninguém...
Não sou meu, não sou nada...
Logo, nunca uma posse
Não me posso dar, não há escolha...
Simplesmente dou, para ser
Um infinito grão de areia
No sem fim de perder a vista
Simples parte, simples todo
Junto e indissociado


IV

Adormece o teu corpo com a música da vida.
Encanta-te.
Esquece-te.
Tem por volúpia a dispersão.
Não queiras ser tu.
Quere ser a alma infinita de tudo.
Troca o teu curto sonho humano
Pelo sonho imortal.
O único.
Vence a miséria de ter medo.
Troca-te pelo Desconhecido.
Não vês, então, que ele é maior?
Não vês que ele não tem fim?
Não vês que ele és tu mesmo?
Tu que andas esquecido de ti?*

*verso-base: Tu que te esqueceste de ti?

Cânticos
Cecília Meireles


Uma música - Famous Last Words - My Chemical Romance