domingo, 27 de julho de 2014

Acorda



Acorda ao meio dia ao lado dela. Acordam juntos, como que sincronizados. Deitados de lado, um de frente pro outro, a perna dela sobre a cintura dele, a dele entre as pernas dela, ele começa a admirá-la, enquanto ela ainda está de olhos fechados, preguiçosamente belos. A beleza dela é um espanto. Um espanto que expande-se a cada dia. Que toma conta do corpo dele como um céu que aos poucos vai-se nublando, aquelas nuvens de tempestade enormes avançando por toda a vastidão de azul, até trovoar por dentro, de emoção, de encanto, de estupefação. Ou o inverso, como se o azul fosse uma grande energia que afugenta toda o cinza, todo o frio, e aos poucos reanimasse o mundo com raios de sol dourados e a profundeza infinita do horizonte agora limpo de nuvens. Os lábios dele revelam um sorriso secreto, de quem se lembra que meses antes nem mesmo a achava bonita... Ou achava, mas, não uma beleza que o impactasse como agora o fazia. Como pode? Como uma mesma pessoa pode se transformar de forma tão intensa diante dos olhos que olham para fora e para dentro? Mais uma vez confirma-se, aí, como o que ele entende por beleza, mais do que a imagem cuja luz percebem seus olhos, é a relação que se estabelece entre o sentir, o ser, o estar, a energia que se enlaça entre os dois. Não que ela não fosse tão bonita quanto é agora, diante dele. Mas, provavelmente, ele não percebesse, não se desse conta, não estivesse tão atento quanto está agora, absorvidamente atento para quem ela é, o que ela sente, o que ela provoca e balança nele. Enquanto ela está de olhos fechados, como que degustando ser observada por ele, ou observando-o de forma mais sutil e subterrânea, ele a contempla, cada traço de seu rosto, de sua boca, de seu nariz, suas sobrancelhas, os detalhes de sua pele, seus cabelos castanhos ora escuros, ora claros, conforme a luz, conforme a maneira como se derramam em seu rosto. Sua mão agora pousa sobre o rosto dela, acariciando-a. Faz-lhe carinho na bochecha, no queixo, no pescoço, na orelha, nos cabelos, e assim continua, por um longo tempo. Uma vida sem carinho não merece ser vivida, pensa ele. O carinho é para ele como uma função biológica, uma necessidade. Quando está com alguém que lhe cativa, que lhe é importante, parece-lhe simplesmente absurdo não estar em contato com a pele querida, não aproveitar os momentos todos que existem para cultivar as gostosas sensações e prazeres que cada parte da pele, do corpo podem sentir, prazeres suaves, calmos, delicados, ou excitantes, despertantes, provocantes. Se aproxima um pouco mais dela, colando seu corpo ao dela. Sua mão envolve a cintura dela, apertando-a contra seu corpo. Acaricia-lhe as costas, sentindo a gostosa linha da espinha, e aquelas covinhas na base da lombar que tanto o excita. E assim que ela abre os olhos, como que atirando-lhe uma flecha de calor com aquele olhar castanho, ele a beija. E os olhos tornam-se a fechar-se, e eles conversam longamente neste silêncio apenas perturbado pelo som dos lábios que às vezes estalam. ´Bom dia, bonita. ´Bom dia, amor. ´Tão tão bom acordar do seu lado. E te ver assim, de cabelos esvoaçantes e descabelados, linda de morrer. Dá vontade de ficar pra sempre muito nesta cama, nesta luz doida que atravessa a janela, nesse tempo que parece que nunca mais passará, sempre nesta manhã ou tarde ou noite que nem sei mais qual é... (ela sorri com jeito bobo) ´Eu tive um sonho essa noite. Sonhava que estávamos num avião, daqueles a hélice, com uma cabine externa, sabe, em que nossas cabeças ficam do lado de fora, com aqueles óculos de aviador, olhando o céu inteiro. Você estava abraçada em mim, e nós brincávamos de entrar e sair das nuvens, de dar voltas malucas, ficar de cabeça pra baixo, e ir aonde quer que a gente quisesse ir. Aí a gente pousava perto de uma praia e transava em baixo da asa, na areia, sobre uma colcha bem macia. Dizendo isso, ele fez ela ficar sobre ele, e voltaram a se beijar. Cada beijo aumentava as vontades, que acordavam felizes. E suavemente seus corpos se encontram. E despertam. E brincam e animam e desfrutam, lentamente, em um ritmo próximo da manhã.. Gozam, suam, exaurem-se novamente, deitam-se, segurando-se as mãos, respiração acelerada, sob o vento refrescante do ventilador ao lado, descansando os corpos, celebrando um pouco mais o estar junto, fazendo o dia um pouco mais amor.

Pequenas Margaridas - Nana

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