quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Ciclos espirais


Uma comunicação silenciosa. Ele é antisocial? Há um charme no autismo. É bela a aparente desconexão. O paradoxo é que enquanto se penetra no universo, se é visto como margem, distância... Consegues passar o dia inteiro sem proferir palavras? Qual o poder e o impacto delas? Diz-se que os livros nos afastam. Imagine, preferir deitar-se n´um canto solitário, acompanhado de maravilhosas centenas de páginas à estar no meio das pessoas, conversando sempre coisas vãs, assoprando o vento com idéias de plástico... Construindo pontes de barro molhado, deslizando na lama...
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As palavras escritas podem ter mais cuidado... elas levam mais tempo... podemos entendê-las melhor... E se todos se comunicassem unicamente através de carta? Ah, o esforço de escrever, o trabalho despendido evitaria muitas cartas desnecessárias...? Escreveríamos estritamente o necessário? O valioso a ser dito?
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Mas, e a beleza da voz se perderia no silêncio?... Nossas majestosas cordas vocais, que se faria delas? Atrofiariam?... Seria natural a mudez?... A música e a poesia poderiam preencher esse espaço, esse vácuo, esse éter... Mas e quando até a canção cala?... Quando a poesia cansa?...
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N´um mundo perfeito, escrever sobre o quê?...
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N´um mundo perfeito, falar o quê?...
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Apenas frases de ordem prática - Por favor, pegue isto para mim. - Já estou chegando - Posso te fazer algo para beber? - Ou qualquer coisa desse tipo...
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A beleza perderá sua razão, pois torna-se-á universal... Tudo se perceberá belo e assim, será simplesmente repetitivo apontá-la...
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A bondade, igualmente... A liberdade e a justiça... Todos os nobres valores desaparecerão da vista... tão somente porque serão plenos... não haverá contrastes que os tornem visíveis...
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Um mundo sem contrastes? Poderemos desejar outra coisa e haverá algo menos desejável? Mas isso é um sofisma, uma interpretação errônea da igualdade... A igualdade será rica em suas possibilidades inovadoras... A inovação será o caminho de cada um... Ou a simples tranquilidade das coisas simples...
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Até mesmo as palavras vãs podem ser elogiadas enquanto notas musicais de nossos timbres particulares... Apreciar a maneira tão única de pronunciar as palavras que cada um tem... E assim, a extinta estética renasce... e a razão de sua morte é também o que a faz resurgir... Tudo se torna estética e forma de beleza... e contentamento... E no silêncio poderemos perceber cuidadosamente cada detalhe do outro... E não cansaremos nunca, pois há milhões de outros, de átomos, de estrelas e personalidades... O que torna a Unidade possível e suportável é a variedade, a diversidade... Só porque é tudo diferente é que conseguimos ser iguais e uma unidade. Essa é a chave... mas não é a única, é apenas uma... de incontáveis... Incontáveis portas, janelas, passagens... para todos os corações e inspirações... Cada um de nós com milhões de fechaduras ornamentadas, rústicas, sofisticadas e toscas... E uma brincadeira eterna, um jogo divertidíssimo e inesgotável de detetive, investigação, desvendamento do majestoso véu da realidade... da eternidade... do mistério... Viva! Vive-se a mística da percepção-ativa... da ação-perceptiva...
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Viva...

Um comentário:

Samis disse...

as vezes as palavras tomam mesmo tanto lugar
as vezes tiram o espaço da vida

ou vez eu ouvi:
"carroça quanto mais vazia, mais barulho faz"
e achei válido