domingo, 24 de abril de 2011

Antimúsica

Os ouvidos vibram incessantes, micr'ossinhos de sensibilidade sutil levados aos extremos do desgate ininterrupto pela impossibilidade contemporânea de sua paz. A calma, o descanso, a tranquilidade destes esforçados membros de nossa constituição sensível é algo tão raro, talvez só possível durante o sono, e olhe lá! Depende de onde você mora, se não tem nenhuma avenida movimentada e insone por perto, nenhuma alcatéia de cães a falar sobre a última novela animal, nenhum alarme de carro zunindo noite adentro, como cigarra/o eletrônica/o expelindo sua fumaça sonora. Ah! A música do silêncio, qual é? Onde está? A sonoridade inaudível do existir, a forma risonha da voz calada, a trama insinuante da vida muda, sem trilha, fora da trilha sonora...?.
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Por dois dias houvi/mos música sem parar... O som colocado no alto da geladeira, coração da casa, irradiava sua vibrante energia, reverberando pelas cavernas escuras de meus ouvidos, rachando-lhe as paredes imperceptivelmente, ocupando cada brecha de meu espírito, pensamento, vazio... O tão precioso vazio... morto - a machadadas ritmadas. Toda sorte de música, forte, suave, clássica, pós, minha, d'outro, além, depois... Até que.
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Eu disse
- Estou afim de ouvir nada.
E o Coro disse
- Eu também / Eu também / Eu também.
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Putz, ouvimos música até cansar, todos os instantes de cozinha, de mesa, de cama, de riso, permeados pela música. E a manhã vitoriosa do terceiro dia foi, enfim, acompanhada pela beleza acústica do nada... do silêncio... dos mínimos sons naturais do coração, do vento, do chuvisco, do viver...
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E Ele disse: Faça-se o Silêncio.

Um comentário:

Samis disse...

eu também!

e ainda não parei pra ouvir novamente!
kkkk