quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Amor em Toda Ação: Notas sobre Relações de Amor Profundo


O amor é como a água. Abundante, sustenta e floresce a vida, fluido, em movimento, transborda, transpira, transforma, chove, cai, molha, arde, inunda, sacia, alegra, embeleza...


O que significa se relacionar? Como estabelecemos nosso estar no mundo entre todos os seres vivos? O que queremos com essas relações? Por que estabelecemos estas relações?

Eu brinco que eu tenho uma personalidade antisocial altamente sociável. Isso porque gosto muito de estar só, de fazer minhas coisas, pensar sobre a vida, rir só, cuidar de mim, ouvir música, dançar, cuidar do jardim, criar, escrever, dormir, tomar banho, sentir-me comigo. Mas ao mesmo tempo tenho muito prazer em conviver com pessoas queridas, pessoas com quem aprendo, cresço, compartilho e para quem me doo, me dou e com elas me sinto bem. Minha casa e minha vida vivem cheias de gente. Adoro cozinhar junto, papear, cuidar do jardim, dormir fazendo cafuné, ver filme, fazer massagem, tomar banho junto, amo aprender com as outras pessoas, desde coisas simples que resolvem problemas bobos do dia-a-dia até histórias de vida e visões de mundo que me provocam e transformam profundamente, e adoro compartilhar qualquer coisa que eu saiba ou que seja importante para mim com todas as pessoas.

E eu amo muito. As pessoas, suas histórias, a vida, plantas, sabores, comida, arte, fazer as coisas com as minhas mãos, minha intuição, aprender e ensinar. Há muito tempo venho refletindo sobre o que significa viver o amor. Libertar o amor para todas as situações, não só as relações afetivas-conjugais-sexuais. Libertar o amor para todas as pessoas, não só aquelas que nos despertam atração e tesão. Libertar o amor para tudo que existe, não só os seres humanos e a cultura humana.

Isso significa nos transbordarmos sem medo, impregnando nossos gestos de carinho e cuidado em tudo que fazemos com quem quer que seja, pessoa próxima ou distante, conhecida ou desconhecida, humana ou não. Como seria tratar alguém sentada ao nosso lado e com quem começamos a conversar no ônibus com a mesma atenção e dedicação que temos para com alguém que nos acompanha há anos e que confiamos? O que significa respeitar alguém que acabamos de conhecer na rua com a mesma intensidade que respeitamos alguém que admiramos profundamente? O que significa cuidar de tudo que nos cerca com a mesma profundidade que gostamos de ser cuidados quando não estamos bem?

É isso que tenho tentando experimentar, praticar, aplicar, vivenciar intensamente. Fazer com que todo abraço seja sincero, demorado, entregue, caloroso. Que todo olhar busque de fato enxergar o que está diante de nós, percebendo profundamente, com atenção. Que todo ouvir realmente se permita ouvir, assimilar o que está sendo dito, refletir sobre o que a pessoa está me dizendo, compartilhando comigo, me expressando naquele exato momento e não sobre o que eu penso/julgo/critico sobre o que a pessoa me diz. Que todo gesto e toque tenha bem-querer, respeito, sincera preocupação com o espaço da outra pessoa, de modo a não invadi-lo, mas também sem medo de expressar afeto com a pele, numa massagem, num beijo, num acariciar os cabelos, num segurar as mãos ou cruzar as pernas.

Amor em toda ação requer um maior esforço, sim, do que estamos acostumados. Pois aprendemos com este mundo odioso a indiferença com o que nos cerca, o descaso pela vida, o desamor pelas pessoas e demais seres, o medo da outra e do diferente, o utilitarismo nas relações e as relações de poder, o machismo, o racismo, as outrofobias, os latifúndios e monoculturas afetivas, a mediocridade no viver mesmo, que nos aprisiona num viver mesquinho, pouco, vácuo, insensível, frio, árido, insípido, devastado, violentado e violento  até... E tudo isso drena e esgota nossas forças. 

Mas não é nenhum esforço sobrehumano. E quando vamos aos poucos nos libertando, problematizando e nos desfazendo de todas essas correntes, prisões, grilhões, bolas de ferro, focinheiras, ideologias dominantes, máscaras, mentiras, de repente amar se torna fácil, fluido, leve, simples. De repente nossa potência afetiva e emocional se fortalecem e superamos a atrofia a que fomos submetidas.

Afetar e nos deixarmos afetar. Afetuosidade vívida, ativa, brilhante, criativa, tranquila, humilde, despretensiosa, destemida, desfrutada. No cuidado das plantas, de todos os seres, da vida, da Terra, de si mesmo, da energia do universo, do tempo, do presente e das presenças.

Amar além, Amar em toda ação.

Me deixa amor - Lariza Xavier - para inspirar

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