segunda-feira, 9 de maio de 2016

A-cor-dá




Azul tem som de pássaro, de asas batendo, de corais brotando da pedra, de pele molhada e em arrepio...

Mas nem todo azul. Azul profundo de solidão tem mais som de vento, som de vazio, som de água quente para o chá, do que um azul de olhos infantis, que tem som de cafuné, de cócegas e de sorriso bobo.

Amarelo tem som de seiva cheirosa escorrendo do sexo da árvore. Tem o som da ponta dos dedos da chama, um barulhinho suave como o da pena de ave caindo e dançando.

Tem amarelo, daqueles amarelos terra, em que eu ouço o desabrochar de sementes, saindo aquele pescocinho delicado de planta recém-nascida. Ouço também o barulho que faz quando a fruta cai, madura, desmanchando-se no chão, machucando-se, mas também derramando-se de alegria pela liberdade alcançada.

Verde me soa dança de galhos e folhas balançando com o tempo do dia. Escuto ainda aquela música que canta dentro quando se conhece outra pessoa, relação esverdeada, ainda por se escurecer. Há verdes temporais que soam lágrimas que cuidam e renovam a gente. Há verdes cujo som é idêntico ao do domingo pela manhã, com toques de passos caminhando no parque.

Roxo é rugido que vibra quando superamos um medo. Ou quando decidimos que esse/s medos não vão deter a gente. Roxo é barulhento, como o barulho dos corpos em êxtase, em saltos, em mordidas, sem fôlego. Lilás já tem o som do soninho que dá após uma vitória, um orgasmo, aquele sono divino que se dorme a dois. Lilás ressoa também a caixinha de música, de som metálico delicado e magnético, fazendo a bailarina girar e viver.

Preto tem o maior e mais longo som de todos, o silêncio. O preto inunda nossos ouvidos com sua vastidão sublime. Às vezes o preto tem o som do medo, mas aquele medo bom, do desconhecido, que nos incita a ir e desbravar. Preto é vibração poderosa, todo tambor tem som preto, toda batida de pé no chão, todo movimento intenso, tem som preto. A história ancestral canta, na maioria das vezes, músicas de cor preta.

A cor Terra, ou marrom, tem som de fruta comida, de pele queimada de sol, de tapioca pronta para ser derretida na boca, de balanço de rede, de canoa cortando o rio. Tem o som da respiração da Terra, o som das marés e dos terremotos, som das cavernas esquecidas e dos precipícios.

E os vermelhos e alaranjados, tem som de pele roçando, som de boca encontrando boca, som de fogo transformando a comida em cheiro e gosto intenso, som de gemido de prazer, gemido de vôo, gemido de morrer. O vermelho é a cor mais musical, pois tem o som do sangue correndo nos músculos, inquietos e eufóricos, sentindo os ritmos dos vários tons quentes e encontrando os acordes certos dos movimentos. Vermelho tem som de afeto, mas também de ódio. Tem som de começo, mas também de fim.

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