segunda-feira, 27 de maio de 2013

Bebo noites...


- Você é como eu, não é capaz de viver nesse mundo... existe por acidente, enquanto não vierem cobrar o preço que não estamos pagando devidamente, entrando por trás na corrida, se escondendo no ponto cego do motorista... Não temos preço, somos impagáveis, porra, por acaso tenho cara de souvenir? Tenho cara de recordação de parque de horrores? Pois é, sou mais do que um nome para se colocar na lápide n´um cemitério apinhado de coisa morta que nem pode se decompor devidamente, na terra, com os bichinhos gosmentos que nasceram para se banquetear com a civilização... tão cercados de concretos estamos que até mortos nos metem n´uma caixa, outra caixa!

Caminha noite´adentro co´mochilas nas´costas puxado por uma grande e amarela e sedutora e arredondada e sexy erótica pornô lua cheia de tesão. Pela noite ela sobe, sobe... ele caminha no encalço, trôpego... caminha como forma de meditar... como forma de ficar ainda mais magro... perder quilos n´uma vida de líquidos e refeições passadas em vão tornou-se um esporte...

- Já disse, vou morrer logo. Durar muito é um fetiche que eu não cultivo. Minha vaidade se resume aos cabelos que eu não cuido, às unhas que eu rôo, às olheiras e a barba que nascem feito mato, aos lençóis com cheiros vivos de noites vivas... Não tenho a vaidade do tempo, do amanhã... Então, vá logo se acostumando com a ideia! Uma sugestão, todo dia você imagina que eu morri... sei lá, faz um puta exercício de imaginação intestinal e finge com toda a sinceridade que eu morri... e sofre um pouco... (se isso te fizer sofrer... se não, toma um suco ou o que quiser fazer)... sente uma pequena parte imaginária dessa sensação que é a morte... cria detalhes interessantes, como tudo aquilo que a literatura da sua cabeça gostaria que eu ainda vivesse, que eu poderia ver, comer, cheirar... sente um pouco esta minha morte como se pudesse ser a sua, como se você estivesse colocando em mim o seu medo da morte.

Subindo a ladeira escura rumo à 'periferia', lugar sem nada por perto, terrenos baldios dos dois lados, ninguém a vista, nenhuma luz de abrigo... bingo! na hora errada no lugar errado começa a descer o cara que o patrulha policial disse que viria me pegar se eu não me comportasse como um 'cidadão de bem'... ele vem eu vou a mochila tá pesada e fazendo minhas costas suarem o cara começa a olhar pro chão o boné escondendo o rosto os braços balançando estranhos na frente do corpo e eu tentando manter um ar fresco no lombo... ele chega perto eu me aproximo cruzamos e um hey amistoso é tudo que não saiu nas manchetes... - e, por acaso, como foi o cara que você imaginou? 

- Sabia que uma dieta de líquidos e frutas e coisas cruas pode te livrar de todas as preocupações mundanas do mundo moderno? Quem disse isso? Um pássaro que conheci... ele não parecia ligar muito pras prestações do último aparelinho que ainda não é sensível o suficiente para sentir o touch do bico dele... que, putz, quebrou a tela... até que virou um espelho legal, a gente multicortado em várias partezinhas esquisitas e cortantes... mas, sabe, lá do alto, megalto que não dá pra imaginar o tamanho da queda, a gente realmente não liga muito pra nada... como eu não posso voar, me contento com sessões o mais diárias possíveis de alucinações frio´salinas n´o´azul mar do meu quintal... deixe-se flutuar, girar, sobrenadar n´uma vastidão que não se pode alcançar... tente tocar com os dedos o outro lado do mar... olhe para o céu, com o corpo submerso, os ouvidos inundados da respiração universal dos pulmões oceânicos cuja asma causa tormentas e derruba cidades arrogantes e cujo suspiro leve leva embora o calor de verão... olhe as nuvens passarem porque tudo que existe vai embora... ir embora é a qualidade da existência... é a razão ontológica do que foi... tem horas que eu esqueço que se vai embora e me afogo e respiro águas que me esganam e eu rasgo dentro de mim essa agonia de não querer deixar ir me agarrando nas cores e sons que ficaram gravadas como marcas de sol... que também passam...  mas agora eu já voltei à superfície e me fiz barco novamente e estou partindo dos portos todos que existem... apenas os blocos de gelo flutuantes que cansam do sul e partem rumo à morte certa no norte é que me serão abrigos forçosamente provisórios! Quando eu começar a me acostumar, terão derretido e será preciso novamente navegar... navegar... navegar... 

Para na conveniência que vende aquele líquido régio de sua dieta de líquidos por pouco mais que um pila e derrama tudo estupidamente gelado goela fervente adentro... nossa, que lindeza é matar, matar folgosamente a sede... melhor que isso, só água gelada depois de uma noite furiosa de sexo e amor e sexo e amor e sexo e amor, intercalados, fundidos, derretidos... mas, pera aí, qual é a diferença?... quem inventou duas palavras prolixas pra algo que dispensa apresentações?... ah, os puritanos que nem sabem do que estão falando...

- Escrever é como parir. Não sei qual é a dor de parir, escrever não dói, não muito... mas, escrever é deixar nascer o que, se não escrevêssemos, morreria dentro de nós e nos faria morrer também... escrevo porque não sei fazer outra coisa pra aquietar minhas feras... porque aquietar minhas feras?... porra, não faz perguntas difíceis... ah, porque ser comido por nossas próprias feras é um tipo de autoantropofagia estranha que eu ainda não experimentei...(putz, tá na hora...)

Hey - Pixies

Um comentário:

diana disse...

pois eu vou fazer um manifesto para a não-implosão