terça-feira, 30 de abril de 2013

Des(caminho)


Quando estou só o mundo desaba sobre mim... sinto toda a realidade de viver pressionando cada centímetro cúbico-múltiplo de minha pele-espírito. Diante das pessoas, uma névoa turva minha tormenta, ilusoriamente ganho um ar tranquilo e equilibrado. Mas não, não... Nada mais do que um despedaço de gentes, uns fragmentos acumlando poeiras, umas folhas caídas voando com o vento, mortas e desvairadas... 

Sinceramente, vivo por impulso, por gravidade, por disparate... Viver me parece diariamente uma chacota de nossa estupidez... Viver apesar de tudo é simplesmente um birra, uma teimosia, como uma criança que não quer ir pra cama, dormir... não se entregar, ficar insistindo no que não tá rolando... 

Que se fodam os pais... deviamos todos ser tão desobedientes quanto a mais insana das crianças... brincar no banho até morrer, comer doce até morrer, ou então construir uma humanidade linda e risonha até morrer... mas nunca não morrer, mas também não viver, como todos os malditos assalariados, proprietários, burgueses, escravos, consumidores e categorias afins...

Tudo está acabando o tempo todo... tudo se foi... não existe nada... Mover-se no tempo/mundo é como deixar-se flutuar na maré... mas eu fico nadando o tempo todo, por medo de me afogar... canso, fico sem ar, me desespero, fico com medo de que tudo dê errado, desconfio do instante seguinte, de que outra onda vai arder-me os olhos... 

Hemorragia emocional... sangro, sangro diariamente, inteiramente, fico pálido, nu, cru... movo-me como um coco jogado pela tempestade... fico dançando descabeladamente no vazio branco e extático de música e átomos e vazio e ausência e nada... Não vejo diferença entre vida e morte. Talvez só a aparência. Na vida temos essas aparências com que nos acostumar... e, acostumados, vamos nos prendendo, nos enrijessendo... Na morte, o que há para se acostumar? Silêncio... universo...criação... destruição... nenhuma palavra, afinal...

Tudo que sinto que "tenho que fazer", divirto-me não as fazendo... defendendo meu direito de nada... de negar... de morrer... o direito de morrer é fundamental... morrer pra tudo que não é viver, que tal? Morri, esqueça de mim... não existo, se existir exige registros gerais, instituições, cadastro de pessoa física, matrícula, inscrição, pagamentos e dívidas... me movimento apenas... como o que comer, durmo o que dormir, leio o que ler, produzo o que produzir... não sou a comida, nem o sono, nem a cultura ou a produção... sou o movimento apenas... 

Sangro-me em sangria de maçã, vinho e mel... Quem sabe assim saio algo realizável...

Uma música - Corinne - Metronomy

domingo, 28 de abril de 2013

Perdeu o medo...


Um mágico cujos truques terminavam sempre com uma interrogação ou reticências... Tinha medo de olhá-lo nos olhos, como se assim revelasse que não se tinha visto o bastante... Um jogo de dois mistérios em choques e espasmos. Ele parecia ter certeza do que dizia, ainda que não afirmasse nada... E ela, sentindo-se nascida da manhã úmida e fria, buscava as palavras indecisas para descobrir-se. Aqueles grandes olhos de roda gigante e algodão doce e amargo, aquela voz de tremor e infância e calor, os dentes entre os lábios recitando versos de si mesma... Tudo n´um momento de riso desconcertado - um gole de suco de frutas misturado prepara a garganta para o próximo número: uma mágica de palavras obscuras - tecendo fios para envolver dois corpos por dentro.

Escrito às 2h27 de ontem para hoje.

Uma música - Everything goes my way - Metronomy

Alegria...

"
   - Lóri, você nem ao menos consegue sentir o que há de profunda e arriscada aventura que nós dois tentamos? Lóri, Lóri! Nós estamos tentando a alegria! Você ao menos sente isso? E sente como nos arriscamos no perigo? Você sente que há mais segurança na dor morna? Ah Lóri, Lóri, você não consegue recuperar, mesmo vagamente, na lembrança da carne, o prazer que pelo menos no berço você deve ter sentido por estar? Por ser? Ou pelo menos outra vez na vida, não importa quando, nem por quê?
   Lóri não respondeu, sabia que ele adivinhava que a resposta era negativa.
   - Você prefere a dor?
   Também a isso não respondeu, sabia que ele adivinhava que a resposta seria de novo: não.
   - O que é? Para aprender a alegria você precisa de todas as garantias?
   Ela ficou em silêncio, porque o tom de Ulisses mudara e em vez de ardente se tornara sardônico e era para feri-la. Ele reclinou-se na cadeira um pouco cansado e disse:
   - Você é das que precisam de garantia. Quer saber como eu sou para me aceitar? Vou me fazer conhecer melhor por você, disse com ironia. Olhe, tenho uma alma muito prolixa e uso poucas palavras. Sou irritável e firo facilmente. Também sou muito calmo e perdoo logo. Não esqueço nunca. Mas há poucas coisas de que eu me lembre. Sou paciente mas profundamente colérico, como a maioria dos pacientes. As pessoas nunca me irritam mesmo, certamente porque eu as perdoo de antemão. Gosto muito das pessoas por egoísmo: é que elas se parecem no fundo comigo. Nunca esqueço uma ofensa, o que é uma verdade, mas como pode ser verdade, se as ofensas saem de minha cabeça como se nunca nela tivessem entrado?
(...)
   - Tenho uma paz profunda, continuou ele, somente porque ela é profunda e não pode ser sequer atingida por mim mesmo. Se fosse alcançável por mim, eu não teria um minuto de paz.
"

Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres - Clarice Lispector - pág. 59 e 60.

We broke free - Metronomy - uma música 

nada...


Para ganhar nada... aprenda...
Tudo que fizer, nada queira, apenas deixe...
Não queira o dia de amanhã, se ele vier, que enfeite...
Em tudo que for, se entregue...
Doe-se como um miserável
Se nada tem, nada pode guardar...
Esprema-se o sumo do corpo
Derrame-se no cume de ser pouco
Não poupe nada, grite rouco
Esqueça-se das roupas, pano roto
Perca-se dos outros, bicho louco
Caia dos ares, ave etéria
Dane-se muito, vil matéria...

As sobras de si não recolha que o vento
espalha ao relento...

Freely - Devendra Banhart - uma música

Ébrio como a noite...


Dançava na pista, no palco, na rua, no centro dos círculos de corpos ritmados... dançava com seus quadris rebolando na batida dos sons e dos batimentos de fora e de dentro e ombros e mãos suavemente deslizando pelo ar de forma insinuante, mostrando a quem quisesse ver que ela fazia a música com seus movimentos e não o contrário... seus pés e joelhos vibravam, na ponta dos pés, balanços ínfimos, jeito de gingar, concretizando os sons no corpo, materializando as notas acordes instintos... cabelos negríssimos ondulados ondulando sobre os ombros caindo sobre os seios incendiados por baixo daquela blusa branca folgada solta e top negríssimo na pele chamuscada de sol... olhos fechados cílios derramados n´uma expressão indecifravelmente irresistível... a boca como mordendo-se, comprimida, úmida e saliente, lábios grossos mas pequenos, nítidos, líquidos, rígidos... no tornozelo esquerdo serpenteante a tatuagem provocante de fruta madura sangrando orvalho mordida e desejada... unhas pintadas de preto carvão vulcânico, pés descalços, anel no dedo do pé, tornozeleira prateada, brinco mínimo como gota de sede no umbigo...

Ela não sabia mas sabia-se observada... dançando como ela, com ela e a distância, no mesmo ritmo de corpo que quer e não pode deixar de dançar... na mesma imersão ébria que responde todas as perguntas que nem deviam ser feitas...

Para dançar - The Look - Metronomy

sábado, 27 de abril de 2013

Cinzazul...

Parados como uma árvore velha com as folhas úmidas da chuva - chuvinha que caia como sininhos ciganos nos tornozelos das nuvens - olhavam o vácuo do tempo em busca de imprecisões... Conhecidos desde ontem, trocaram nada mais que treze palavras excessivas... Unidos por goles de chá ardido de raiz e erva untado de mel dourado de cheiro aromatizante, banhavam-se da luz fria da tarde que morria... A morte presente nos átomos, no oxigênio, no fogão queimado, no quintal tomado de eras, fazia-se diálogo de silêncio entre o soprar e sorver o líquido fumacento nas xícaras frágeis nos dedos longos... Como foram parar naquelas cadeiras de boteco na sala de estar? Sala que era varanda e cozinha e um pouco de terraço também... Quem fazia a chuva, o coração nublado dele, os olhos trovejantes dela, ou a simples ausência de estrelas no céu?... Não importa. O relógio parou e ninguém tinha para onde ir no dia seguinte... podiam-se demorar preguiçosamente um perto do outro até descobrirem o que os intrigava a não querer partir... 

Kill me twice - The Delano Orchestra - uma música

Combustão...


Uma relação fósfórica... que de tantos contatos concretos intensos imensos explodem faíscas, fogos, queima e deixa um rastro de cinzas... Do fogo faz-se lágrimas, íngrimes, limítrofes, cítricas, místicas... Da caverna moem-se paredes, garimpam-se dores, unhas, tripas, úlceras, sutras... 

Exaustor... exaustivo... exaurido... tanta emoção intravenal atmosférica - quimérica - pode matar-me de desabamento cardíaco. A dor pesou demais, amassou o sangue, despedaçou o ar, derreteu as horas, comprimiu a pele esturricada pela angústia... 

Sinto-me nocivo, ruído, corrosivo, destrutivo... como ao tocar, eu cortasse, ao sentir, eu rasgasse, ao querer, eu roesse... 

Meu instinto/impulso está foragido, deve sumir por uns tempos... Sou então um corpo sem cor... Cometeu o crime de não pensar, não ver, simplesmente avançar sem permissão... Prisão - covil - canil... Meus dentes´dedos amargam o sabor de conter... Vou por tudo que existe em mim n´um saco grosseiro e manchado e largar no rio... deixar boiar até a mata para soltar novamente entre as feras...

Volto ao estado bruto da pedra, da árvore, da seiva crua que engole pássaros... Uma floresta sombria... de musgo, olhos esquivos, ar parado, areia movediça... Poucas trilhas por onde entrar, (des)lugar fácil de se perder... Afundei uma clareira para fogueirear... lá se acampa de baixo de estrelas esquecidas... Bebo um gole da água minéria do riacho frio... a garganta seca não aguenta mais falar, não lhe passam mais palavras... a trilha fechou, os galhos e espinhos tomaram de conta... 

Sinto-me sem... Sento-me sem... Insustento-me sem... 

Parto para encerrar o estado de pendência...

Step out for a while - Patrick Watson - uma música...

sábado, 20 de abril de 2013

Noite mar



Navegando na noite escura como um barco perdido no tempo sem medo de sombras e ventos ou ondas espumas enchentes boiando nos pelos das pedras em alto mar olhando o céu azul e cinza de nuvens e lua e estrelas aqui e ali poucas quase nenhuma nessa cidade de tanta luz que nada ilumina - Olho de dentro da escuridão passos e vozes que molham os pés na água fria tão distante que meus olhos cegos apenas ouvem a música da onda atento mergulho debaixo da montanha molhada veloz que tenta me pegar em vão nado braçadas descansadas intensas querendo chegar no fundo profundo mas volto e toco a´reia com´s pés... passam as horas de nuvens brilhantes vermelhas escuras tão altas que parecem cabelos no céu soltos encaracolados voando enquanto deito na cama do mar de costas pra profundeza imensa sem pensar que estou na mesma água de todas as praias de todos os sóis de todas costas e ombros e pescoços e corpos do mundo na mesma água de tudo sem saber de mim...

A boy and the Birds - Your hand in mine - uma música

Gato morto

Para´eu andar comigo, foi preciso morrer um pouco
Deixar pedaços, esquecer espaços, cortar laços
Para sentir-me eu, ir aonde ia
Foram-se partes chamuscadas,
Queimaduras gritadas
Lesões em caixa alta...

Morrendo, sobrando menos, 
Fica na gente uma sensação amena
De unicamente apenas
E só...

Morrer em tudo, dentro, fora, 
no centro, na borda
Esquecer de tudo... sobrar apenas eu
Para essa autonomia se concretizar
Fluída como o quebrar da onda negra
na noite de maré baixa...

Pra tudo, fazer, comer, andar,
Nadar, correr, respirar,
Sonhar, dormir, aquecer...
Quem não souber fazer
Consigo, vai ficar
Na beira do abismo
querendo pular...

Há tudo, tanto, somente quando
Não queremos, nem olhamos, 
Apenas seguimos um canto
sussurado de brincadeira
Para ninguém ouvir...

Com a ponta dos dedos vibrar
As teias tecidas entre todos os cantos
Concentrar-se no som que faz
O viver sem esperar ninguém...

Uma música - Jaz - Simona Talma

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Des´frutas...


Ora vivem na escuridão, tateando-se com dedos querentes, olhos marejados, bocas mordentes, corações latejantes, corpos inquietos. Não sabem o que será. Indefinição. Cada dia revela emoções que desvelam seus espíritos e inconscientes, que caminhos podem seguir... A soltidão de si mesmos ante um ao outro os desconcerta. O que fazer? Como fazer para serem apenas e estarem como queiram? Como traduzir esse querer, distinto de carência, distinto de solidão? Quando se encontram, é sim um encontro: um-com-o´utro. Quando estão separados, como estão? A ele parece inexistir separação... tão pertinho, tão quentinho que a sente. E ela talvez também se sinta assim, mas às vezes não. Neste momento não consegue duvidar do hoje nem do amanhã. Momentaneamente está crente de que tudo vai bem... e vai continuar bem... Mas há pouco não era assim. Há pouco era o pior pessimista, sentindo-se uma sombra no meio dos outros. Os polos dele inverteram-se mais uma vez. Da expansão para a contração e novamente para a expansão. Mas com calma. Calma, amigo, calma menina. "Deixa ser como será"...

Assim, soltos... e juntos... Como duas frutas maduras no alto do galho, lado a lado, sentindo-se os poros, as polpas, os sabores... prestes a cair a qualquer momento, decomporem-se, transformarem-se... Amar´durar...

Será que um dia vai aparecer algo verde, azedo, ciumento, para derrubar os galhos? Para afastar, impedir, querer só pra si?

Um dia ela chega com a notícia. - Conheci alguém. To com uma melancia no peito, toda molhada, vermelha até não poder mais... E não consigo me desprender dele, nem ele de mim. E estou feliz como nunca pensei e preciso te dizer que não dá mais... Ele não gosta, não consegue entender... Eu também não sei se consigo... É muito pra mim, meu corpo não cabe. De toda forma, não dá... um dia, quem sabe... a gente volte a se ver... Mas vamos ficar assim, tá, de boa, sem mais... 

Uma semana depois eles se encontram. A sós, n´um corredor entre salas grandes, uma escura, luzes coloridas, música dançante, outra clara, bebidas refrescantes, animantes, gente e vozes de ensurdecer. Naquele meio, estreito, um diante do outro, o movimento cessa, o som apaga, o mundo acaba. Ficam só os dois. E se atracam, se abocanham, se desesperam, se arranham, se entregam... Não conseguem - não estar - não querer - não se deixar um ao outro... 

Dá merda. O outro cara, o que "não gosta", não entende. Não entende que não é um caso, não é um passado, não é nada disso. É simplesmente que eles são, pô... são e vivem sendo e quando se encontram, não podem deixar de ser... Um e outro são um para o outro... se sentem com o outro, como nuvens que se fundem, se mesclam, chovem, evaporam, trovejam... Não tem nada a ver com ele. Ela tá afim, ela ainda tá melancia pelo outro... massa, sem problemas. Mas e aí? São sabores distintos, sensações, convívios, atmosferas, realidades, vontades distintas... cada uma a seu jeito, merecem ser vividas...

Ele um dia chega - Tô doido. Quando te vejo, meus olhos te beijam. Quando te beijo, minha alma te transa. Quando transamos, meu abismo se esclarece. E como se não bastasse, estou também insano. Porque ainda estou doido por uma índia ou cigana, olhos puxados ou desavisados, bruxa ou xamãnica, sei lá... sabe?... Estou voltando aos confins da terra, virando do avesso quantas vezes a flor do maracujá permitir. Jah, Jazz, Exu e Shiva piram-me os sentidos e os limites. Ela ri demais, se embebeda com o jeito descabelado dele de quem fez travessuras e gostosuras. Ele gargalha junto, caem no chão, rolam, pinga chuva, enrolam-se nos cabelos, despejam beijos... despem-se ali mesmo, fertilizam as gramas e ficam quietos... sem forças para se mexer...

Uma música - Dyin´ alone - The Delano Orchestra

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Sol e mar

Os compromissos se descompromissaram, descompressando veias, verdes vivas vontades...
Acordando pra lá da hora ideal, despreguiçando-se tranquilo e ainda assim desobedecendo a lei da hora certa, do horário pontual, pegando o bonde via-costeiro n´uma viagem amiga, encontrando tantos em toda parte, a cada trajeto, a cada momento, pôde o moço hoje se reconcilar consigo...

A manhã teceu renovadas forças... a tarde libertou embriagadas necessidades... o encontro marcado desmarcou-se e então voou pro mar, nadar, mergulhar, flutuar, esverdear, azular, marear...À noite, pôs sua querida banquinha itinerante de suas expressões e artes... Noite de encontros, conversas, leituras, palavras e descobertas inocentes e simples e que ensinam a simplesmente deixar-se levar pela maré... boiando, batendo os pés, emergino e submergindo n´uma brincadeira de praia...

Uma música - Apesar - Trupe Chá de Boldo

terça-feira, 9 de abril de 2013

Pequenos 'grandes' prazeres da vida²


Viciar-me na música que diz exatamente o que sinto...
Tentar esquecer os lugares que me lembram o que não quero lembrar...
Ir na Feira comprar verdes e coloridas frutas e verduras e lindas e deliciosas
Usar um saco inteiro de farinha de trigo sem dar bichinho, fazendo mil e uma coisinhas gostosas
Baixar mais filmes do que posso ver...
Começar um na madrugada e não conseguir terminar...
Abandonar tudo que "tenho" que ler para curtir só o que "tô afim" de ler...
Pegar ônibus e curtir a viagem sem precisar me preocupar com trânsitos, sinais, loucos, freios, nada de direção...
Aprender a curtir um guaraná com mel, limão e gengibre sozinho
Escrever madrugada afora para esquecer meus problemas...
Fazer e beber litros de chá e muito hortelã na veia...
Colher folhas orgasmicamente cheirosas de manjeiricão do pé que tem na varanda
Preparar sanduíche de cebolas fritas com requeijão e queijo ralado para alguém querido/a
Tomar banho gelado da cachoeira/chuveiro que tem aqui em casa
Logo após lavar o banheiro lindamente como expurgando minhas próprias sujeiras
Te ver assim como és sem nada entre nós, teu nariz e tua bochecha e teus olhos e cabelos
Nadar no mar como n´uma piscina gigante no fim da tarde
Estar com meu irmão e amá-lo muito me fazendo criança com ele
Estar com minha irmã e senti-la comigo e querer conhecê-la melhor
Esquecer que me sinto só e buscar as pessoas para conversar, obrigando-as a conviver comigo (huahauah)
Rir de mim mesmo, de como sou absurdo, bizarro, estupidamente sem sentido...
Acender velas no quarto e incensos e derrarmar-me nos teus braços
Sentir que me transcendo contigo, que me poscendo sentigo
Sentir falta de/o que/quem não conheço...
Esquecer de me acostumar a sentir as perdas e conseguir de fato viver a vida simplesmente
Ter milhões de ideias e rir muito porque me odeio por tantas ideias e continuar a tê-las e me divertir com elas...
Sentir que a morte está aqui e agora e que estou vivo só de sacanagem
Inventar, mentir, fantasiar literaturas emocionais só para comprazir minhas saudades
Ouvir músicas tristes para ficar feliz
Comer ameixas lindamente roxas e vermelhas e com detalhes quentes e lindos
Comprar e devorar castanhas de caju lindas e quebradas e queimadinhas por uma pechincha de preço
Tentar desesperadamente fazer a agenda todos os dias e registrar minimamente o que fiz da vida
Sonhar que um dia farei tudo que digo... - tipo largar tudo ; P
Falar ao telefone horas a fio...
Fazer auto-pós-intravenal-psicanálise contigo
Ir e vir entre suores e amores
Tomar aquele açaí genuinamente paraense com inacreditável creme de tapioca
Dormir e acordar como se a madrugada tivesse sido tranquila...

Uma música - Vermelho - Marcelo Camelo

Em última instância...


Um gole de chá. Gosto de cenoura com chocolate na boca. Respira fundo. Sente a ponta dos dedos, o aperto, os pesos, os sôfregos sentimentos, os atropelos e desalentos. Sente-se só. Rodeado de nadas, sem querer/saber nadar... 

Imagina a existência. Existe. Deixa-se existir por momentos indefinidos, sem saber, sem querer... na noite imensa, que a cada noite engole-o mais profundamente. 
- Existimos... Mas não é tão simples existir... sempre em movimento, buscamos, mas não sabemos bem o quê... E quando paramos de buscar, quando por um momento parece que a busca acabou, justamente aí, puft, esvai-se tudo, e tudo que era sólido "se desmancha no ar"... Solidão... sentir-se só... um livro me disse que tudo começa aí... por alguma razão os seres se fizeram seres, separados do todo, e indivíduos, isolados, se entristeceram... sentiram falta da unidade, falta de tudo, pois outrora tudo foram... e nessa angústia, sofrimento de solidão, que gera ansiedade, que gera medo, que gera tristeza, que gera ira, insegurança, raiva, fuga, dor, torpor, dessa angústia começamos a buscar... Buscar não só o alimento, o abrigo e aquilo que nos sobrevivia, mas algo mais... algo que nos conectasse, que nos unisse a tudo, a todos, que nos fizesse sentir-se parte... parte de algo, daquilo que conhecemos ou que sentimos... E tantas maneiras inventamos para nos unir... e nos unindo fomos fazendo a humanidade... Mas de repente, alguém/alguéns,  sabe-se lá, na angústia, na insegurança e todos esses derivados, paradoxaram... Ou seja, inventaram uma separação para superar a separação... um isolamento para mitigar o isolamento... Fizeram cercas, criaram o poder, inventaram de sentir-se superiores, acharam de mandar, para assim enganar suas solidões... Forjaram domínios, estruturas, valores, que os justificassem poderosos, e, achavam, se poderosos, logo, jamais solitários... E dessas separações inventadas tantas outras se inventaram... já partidos do todo, nos dividimos, nos fragmentamos, nos despedaçamos em vários pedacinhos... E hoje, vivemos cercados de tantas ideias, valores, estruturas, imagens que nos separam... que nos fazem fechar os olhos para uns, negar outros/as, ignorar tantos/as, esquecer muitos/as... uma humnidade fechada e reduzida, que é até tal ponto, a partir daí é outra coisa que não me importa nem quero sentir...
- Mas, como somos tudo e todos? Olho ao redor e não vejo ninguém que me pareça semelhante, afim, próximo, que possa me ouvir e com quem eu possa aprender... Ou não, talvez veja e me sinta invisível... como transpassar as barreiras que hoje nos separam, tão artificiais mas tão intransponíveis? Parece loucura chegar para alguém desconhecido e dizer algo realmente importante para nós, que precisamos compartilhar... Todos são tão desconhecidos... E os conhecidos não me parecem menos desconhecidos... A única coisa sensata parece falar sobre o tempo, o calor, e fingir (sem nem me dar conta) que estou muito bem, obrigado...
-  É... estamos submersos nesses ciclos de separações... mas acho que alguns tornam-se mais separados do que outros... Muitos conseguem apegar-se a algos e alguéns de tal modo que este/estes/estas tornam-se seu "tudo e todo" e ignoram assim o restante, tudo o mais... E assim, apegados, fazem-se ainda mais separados... assim são os relacionamentos em geral... fechados, restritos, com a limitação por definição... exclusivos, excluindo...
- Não só os relacionamentos... independentemente disso, sinto-me separado... inacessível... como se não importasse, sabe... como se eu não fizesse falta a nada/ninguém... insignificante no mundo... essa busca é, além de tudo, a busca por ser visto, ser reconhecido, ser buscado também, além de buscar... sentir a busca, unir as buscas, brincar de buscar com mais alguéns, rindo, fazendo troça, deitando na grama...
- É tão simples estar junto, estar com o outro... você sabe disso, você já soube, já viveu tantas vezes, mas esquece... Esquecemos sempre... A angústia da separação atordoa nossa memória, nossa pele... Você sente inveja, você quer ser o outro, o outro que lhe parece junto com os demais, esses que lhe parecem impossíveis... Você não se contenta consigo, você não se basta, não se aquieta, não pára... teu movimento é teu suplício... tanto vai que se abandona... tanto sonha que vai só... não dá tempo de ninguém ir contigo, sei lá... ou tanto é tu, tanto é este "eu" que há em ti, que torna-te além, invisível... paradoxo... O que compartilhas não fica como alpiste, atraindo companhias, mas antes como poeira que o vento sopra... esvai...
- Em última instância, que é onde ou quando importa, o pior que pode acontecer é nada... E nada acontecer é lindo... estou farto de nada e (não) aprendo com isso...
- Em última instância, esqueço... bebo toda a dor, engulo o torpor, abraço o fim da estrada e vou...

Uma música - VCR - The xx

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Soltando...


Me julga tão mal...
Me condenou sem juiz
A sentença - o silêncio
Nem ouvidos nem um triz
Pelo que não fiz, 
Pelo que acha que faria
Prova futura que não cometi
Não, não faria, 
Isso que odeia
Não, não sou
Isso aí...

Por que não escuta?
Era tão simples
Uma vontade simples
Que nada queria
Além de desfazer-se
D´um segredo de angústia
Eu confiava
Confiava em você...

Que podia compartilhar, sem medo,
Não pensei
Que podia
Isso acontecer...

Nada queria
A não ser dizer...
Dizer... deixar ir... soltar de mim...
Nisso nada há de ruim...
Mas mesmo assim
Foi o fim...

Uma música - Raízes no Quinta - Phillip Long

Desconversa...


- Vontade de conversar com as paredes, que elas me fossem simpáticas, amigas, que me reconfortassem...
- Queria ouvir qualquer coisa que me acolhesse a alma... não sei, não é tão simples assim... não é "qualquer coisa", mas algo que não sei mas que só serve isso...
- E talvez o problema não seja nem o quê, mas quem... não me leve a mal, mas eu estava precisando...
- É, não dá... é maravilhoso estar... mas é tão bom estar de várias formas, diferentes... cada jeito cuida de uma parte de nós... Precisamos de vários sabores para animar a vontade de sentir... 
- Acontece que estou frágil, instável, sensível, não estou suportando nada... Quando me tornei tão quebradiço?... Se antes era demasiado razão, estaria eu hoje execessivamente emoção?
- Minha vontade de existir, de fazer, de seguir, está tão ao sabor dos ventos, do espírito, que mais parece uma vela rasgada ao vento... bailando sem controle, disforme, sem forças...
- Não sei o que preciso... flutuar ao sabor da maré, talvez... deixar-me abandonar pelos dias... 
- Não quero remediar-me... nem curar-me quero... não quero mais nada... não quero querer... Agora sinto que querer é apegar, é agarrar, e isso me dói... Isso dói... não querer, apenas deixar... largar... soltar... estar, sem mais...
- Vamos então simplesmente estar, sem esperar, sem esperança... assim podemos apenas viver... o que der pra viver...

Uma música - Real Love - Phillip Long (John Lennon)

Desfazendo nós [na garganta]...


Em nós, enrredados, enlinhados, amarrados, presos, perdidos...
Sob ideias, concepções, julgamentos, ansiedades, inseguranças, controles...
Correndo em círculos, vamos de cova em cova, nos enterrando em abraços
Que ora desfrutam, ora sufocam...
Fazendo d´um mesmo beijo céu e algema
De dois espíritos livres aves atrás de grades

Por quê? Por que fechar quando a janela quer abrir?
Os braços querem voar
A boca quer cantar
O espírito quer desvelar
Toda sombra, toda manhã
Aprofundando a si e a tudo
Em tudo, sem limites

Por que amor limitação?
Ao invés de um infinito que não cabe n´um casal...
Maior que restrições do comum senso
Por que não um oceano de encanto e compreensão?

Mas, na tentativa de libertar
Para que possamos todos livr´amar
Dores romperão
As correntes-coração
Pessoas partirão
Faz parte, ou não?
Enfim, é sim
Um caminho de amor e (dor)...

Uma música - South 2nd - Cocorosie

terça-feira, 2 de abril de 2013

Mantra


Não quero nada,
Não quero ninguém
Sou apenas um movimento...

Enterrei meu coração na curva do rio...


Enterrei meu coração na curva do rio...
Que ele se disolva no mundo...
Fertilize o mundo...
Se transforme em tudo...

Que toda a tristeza e alegria que me dilacera
Se escoe para o rio...
Que eu me transforme no fluxo
Natural
Que ama e destrói
Que nutre e inunda
As margens do mundo do que é
Nunca o mesmo, sempre sendo...

Na curva do rio
No ciclo do rio
Me liberto
De tudo que tenta
Agarrar, perdurar, se enganar
Vou-me, sempre indo
Com todas as margens
E todos os rios... 

Uma música - The meeting place - The Last Shadow Puppets