segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Reescrevendo


Com a lâmpada da mesinha de trabalho acesa, com uma folha inteiramente branca diante de si, põe-se a escrever - a mensagem de celular é o equivalente das cartas neste início de contemporaneidade. Já foi o e-mail, mas hoje, pelo menos para mim, a subjetividade e o simbolismo afetivo de receber e enviar cartas está contido/a no micro-momento de digitar freneticamente palavras queridas e aguardar pelo alerta sonoro característico deste correio. Pegar o celular e lá estar o envelope que informa nova mensagem instantaneamente desperta uma emoção e expectativa quanto ao conteúdo e remetente, esperando ser aquela pessoa querida com palavras que nos faça bem, que nos preencha de notícias, que nos aproxime um pouco mais dela. Palavras que nos envolvem. Trágico quando em vez da carta querida, é apenas algo comercial, conta, informação inútil. Assim, a mensagem do celular ganha uma ritualística, discorria o moço em mais um noite adentro ativa, insone, em que os pensamentos brincam de esconde-esconde, pega-pega nos labirintos elétricos do corpo e acham tesouros de ideias. Escrever cartas, continua, debruçado agora sobre o chão de madeira da casa ancestral, é um ritual que percorre e percorreu diversos momentos de sua vida, desde as primeiras cartas de amizades distantes, conhecidas por acaso e de forma tão ligeira, longas e muitas páginas escritas em aulas de física, intervalos sob mangueiras, tardes azuis de adolescência, passando pelas tempestuosas e conflitantes cartas para a mãe-monarca, exigindo mais direitos a partir de argumentos bem pensados na estrutura da carta, até, enfim, as infindáveis e extasiantes cartas de amor, como aquelas escritas numa lanchonete qualquer na porta do colégio esperando por ela. Levanta-se e vai buscar um copo d´água, inquieto que é. Muitos períodos de carta nenhuma ele passou, um tempo em que escrever no papel uma mensagem para alguém se tornou supérfluo, porque a relação era tão forte que tudo se dizia olhos nos olhos ou, no mínimo, ao telefone, voz ante voz. E agora, talvez, tenha voltado a era em que o tempo permite às palavras descansarem e perdurarem no papel de carta, palavras que poderão ser lidas e relidas muitas e muitas vezes...

Please, Please, Please, Let Me Get What I Want - The Smiths

Nenhum comentário: