“Por que não nos falamos mais? - Vontade”
“Tudo de bom que vivemos não significa
nada diante do que foi ruim”
“Se quebrou e não existe mais”
“Esqueceu-se de trancar as portas, parece
que o convidou, parece que já não se importa, parece que algo mudou”
Sinto minhas mãos semifortes, trêmulas, (in)certas.
Uma fraqueza subentendida na esquina dos nervos misturada com uma (in)certeza, (quase)firmeza,
de que consigo escrever minha vida da forma que eu quiser, precisar, buscar,
ir.
Sinto o movimento dentro de mim fluir, como um rio
que se manifesta de inúmeras formas, as águas caudalosas e potentes que seguem
pelo meio e fazem O(s) caminho(s), as águas distraídas e rodopiantes
que se perdem nas pedras, a água que se desvia para poças, se aquieta, vira
laguinhos, a água que evapora, desfalece, desiste e vai embora, a água que
retorna no contrafluxo enigmático e frio que existe no fundo, a água bebida
pelo entorno, pela terra, pelas seres todas, verdes, dinâmicas, sedentas, a
água que soma, que dança das nascentes e segura na mão e segue junto, a água
que chega ao Todo, ao Mar, ao Infinito, ao Mais, a água que congela no frio, parada,
melancólica, vazia.
Nunca me senti tão frágil, vulnerável, ferida,
morta, despossuída, fraca, hipersensibilizada pelos malmequeres dos dias e
noites de dor e de perda, esgotada e exaurida por tudo que se foi, tudo que
partiu, tudo que morreu, tudo que esvaziou. Ao longo da vida vivenciei inúmeros
processos de demolição.
[Metáfora que remete a uma infância brincada com
joguinhos de peças remontáveis na forma que a imaginação quisesse, e que de
tempos em tempos decidia desmontar tudo tudo que havia criado, cansado de tudo,
querendo outras possibilidades pra tudo, destruía tudo e sobre a montanha de
peças reconstruía tudo de novo]
E em cada processo de demolição sentia que sobrava
menos, que todas aquelas certezas, conceitos, ideias, sonhos, materialidades e
imaterialidades do meu eu e do meu mundo ruíam, caiam, destruídos e desfeitos, e
então me lançava na árdua e exaustiva tarefa de me (re)criar a partir das ruínas
e das invenções de mim e de tudo que naquele instante se fazia presente e intenso,
significativo e inevitável.
A cada demolição sobrava menos, e me sentia mais
apurada, concentrada, consciente dos meus movimentos e fluxos, meus caminhos e
intuições, meus inconscientes e loucuras, meus sonhos e utopias. E nisso me
fortalecia, crescia, ampliava, expandia, ia, mais.
Mas desta vez.
Desta vez sinto-me menos.
Contudo, hoje me sinto mais resiliente do que nunca
antes, mais capaz e eficaz de cuidar-se, de restaurar-se diante de todos os
golpes, choques, ataques, mortes, frios, dores, paixões, impactos, quebras,
perdas, danos, aprimorando-se e aprofundando-se nesse caminho de e em si, desse
autoenraizamento, autotratamento, essa autopoiese, cíclica, transformadora e
emancipadora.
É o momento da minha vida em que consigo me cuidar
da forma mais plena e ativa, constante e decisiva, ligeira e intensa. E
considerando isto, toda a fraqueza, debilidade, dor e morte que tenho
vivenciado não tem me impossibilitado, imobilizado, impedido de seguir outros
movimentos que existem, florescer onde é possível, cultivar o que dá, o que é,
o que mais.
A inevitável contradição. Tão frágil, mas tão
segura de mim e em mim. Tantos cortes/riscos, e tão desbravada e livre. Tão
ferida, e tão florescida. Num caos tempestade louca que luta por desorganizar e
desmanchar as inúmeras teias e redes de apoio, cuidado e construção coletiva e
individual que teci na vida. Sofro, mas sigo. Dói, mas consigo. Sangro, mas
sinto que a Vida está aqui, está sendo aqui, é aqui, é isso, tudo, muito,
tanto.
Casa Caracol, Natown, 19h46, terça-feira,
30/08/16.
Nenhum comentário:
Postar um comentário