quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Castanho (amor)


O riso é uma fuga
O riso é um espelho

O riso é uma janela
um chamado, um desejo

ele é um mistério
um grande ou pequeno
deletério,

um sair do sério

um escudo ou um sonho

é uma injeção anestésica
ou colher de amnésia

um refúgio do medo

ou o próprio medo

é uma máscara
um baile inteiro
o riso é de pernas bambas

rindo no chão, de joelhos

é um desafio ou uma coragem
ele é falso, é miragem

ou é profundo e verdadeiro

ele é histeria febril

ele é felicidade cega

ele é calmante da alma
um remédio, uma seta
apontando uma forma

de caminhar sem dor

ou além da dor

O sorriso é o oposto
Sorrir é abrir-se, abrir
a alma e a vida
Sorriso de amor

de encantamento,
de ternura,
de carinho,
de paz e pureza
Sorriso de destemor

maior que o medo

maior que a dúvida

maior que a dor

Sorrir por amar

a vida, a água, o verde, a luz

a noite, a morte, a paz e a cruz

o outro, a si mesmo, a tudo, nada
Sorrir, principalmente

Por sentir no peito

A magia impossível e reluzente

O amor por você, sua alma, seu jeito

A paixão de emoção de sentimento

Amor com tudo, amor sem tempo
Amor no eterno e no momento

Amor no meu sorriso.









Ai, meu bem,
Como podes ser vulgar?
Se só pureza encontro no teu olhar

Até mesmo a malícia não é vulgar
Vulgar é o ordinário, o sem valor
E não há ninguém mais especial

O vulgar não tem importância

é descartável, é banal,

não se aprecia, se devora

sem sentir sabor ou prazer
sem apurar os mínimos detalhes
as curvas delicadas
as belezas desapercebidas
nuances da tua pele,
da tua voz, do teu ser
da emoção de estar contigo

Não, não és vulgar,

não és comum ou simplória
és labiríntica tempestade de caminhos
e desejos e poesia e carícias
és sabor de sem fim
és sala de espelhos

onde nos encontramos
sob
várias formas de lilás
um bem que faz

calor e paz

carrossel de lápis

e papel de carta

saudade peça de teatro

desejo sofá de areia salgada
carinho de fim de tarde
e hortelã e perfume...
(que arde)

Tu, meu amor
Te finges de vulgar
para disfarçar

qualquer coisa

para esconder - expondo -

um não sei o quê de engano

algo de noite e de dano
tentativa de profano

não sei, não sei
só fingindo, meu bem...

não é você.


Você é o sorriso (o beijo)
Eu sou o abraço (o carinho)
Nós somos o amor (juntos)

E a vida é o sabor nosso.















O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Fernando Pessoa - Autopsicografia

Nenhum comentário: